Ângelo Alves
Nasci a 20 de Janeiro de 1978, na Póvoa da Lomba. Aldeia à ilharga de Cantanhede, onde o barro cria a uva tinta baga ou o poeirinho. Não nasci no dia da saudade, como Teixeira De Pascoaes, mas no dia da desgraça. Sou um misto de António Nobre, de Cavaleiro Da Triste Figura, de Shelley, de Ângelo De Lima e Rollinat. Dois princípios claros - o amor e a justiça – guiam-me nas trevas. A justiça é a minha religião racional e o amor a religião irracional. Meu pai – António Alves Carvalho -, cavador iletrado, faleceu quando eu tinha vinte e cinco anos; dois dias antes de iniciar o estágio de Física na Avelar Brotero em Coimbra, que conclui apenas no ano seguinte, por motivos de saúde – depressão nervosa. Doença que nunca mais abandonou o corpo. Quem ler o ensaio Visível Escuridão de William Styron saberá que a doença é incurável. No Verão de 2004 troquei umas facécias com uma adolescente, na Praia de Quiaios, porque não-tirava-os-olhos-de-mim. Que olhos! Um mês após este episódio voltei a encontrá-la na sala de aula de um colega de estágio. Ela reconheceu-me e, rejubilante, acenou a sua mãozinha. Amei-a à distância por respeito. O ano lectivo acabou e com ele a minha vida. Deu-me duas lições, o destino, em tão pouco tempo. Quando ingressei na F.C.T.U.C de Coimbra, já em mim corria a paixão pela literatura. Tive a sorte de começar a ler monstros como Mann, Kafka, Steinbeck, entre outros. Hoje possuo uma biblioteca, quase tudo o que possuo. A doença impediu-me de prosseguir o ensino, entretanto, continuava a ler obsessivamente. O que amo é obsessivamente. A doença abriu-me as portas da escrita. Estou longe de dominar a escrita, mas até Fernando Pessoa não a dominava. Possuo alguns livros de poesia para edição e uma novela autobiográfica que estou a terminar. Rejeitei apoio social: meu irmão, engenheiro, e minha mãe são os únicos apoios que tenho. Rejeitei-o, não que seja apolítico, mas porque aprendi com meu pai a nunca receber o que não me custou. Em russo há um provérbio que todo o português devia aprender: ganha pouco e paga pouco. Attila József escreveu no fim do seu famoso Curriculum Vitae «Considero-me um homem de honra», infelizmente ninguém lhe deu a mão. A sua poesia ficou. Também me considero um homem de honra. Para mim a literatura não é inútil, como estupidamente considera o senhor F. J. Viegas. Certamente desconhece os grandes escritores que temos. O cinema, as bibliotecas, os políticos a citarem poetas… Um dia regressarei ao ensino. Tchekhov conseguiu conciliar o amor pela medicina e a paixão pela literatura, o mesmo sucedeu com João De Araújo Correia, que durante a sua doença escreveu os Contos Bárbaros.
É autor de:
(Poesia - 2012)
Sinopse: Uma miríade de vozes convergem para a criação da voz bem própria de Ângelo Alves. Este "Doidivino" é uma obra a ler e Ângelo Alves um nome a reter no panorama da poesia actual em Língua Portuguesa.
